sábado, 2 de agosto de 2008

Tributo a um pai amigo

Há dias em que o nosso coração bate mais forte, fica apertado e a saudade se faz companheira. Como disse um poeta "a saudade é a companheira de quem não tem companhia". E aí as cenas semióticas e enunciativas se fazem presentes e são tão fortes e tão significativas que chegam a "machucar"... Foi assim que me senti hoje. A lembrança do "Velhinho Barreto" me levou às lagrimas... Lágrimas que num misto de saudade e emoção não podem calar pelo muito que representou para mim, meus irmãos e netos aquela figura de homem simples e forte. Enérgico e convicto de seus propósitos. Honesto e íntegro nas suas ações. Correto e de caráter firme em suas atitudes. A ele, devemos as lições de hombridade e de cumprimento com os nossos deveres. Costumava dizer que "a palavra de um homem é como um tiro" e documental como " um fio de bigode". Jamais vou esquecer que enfatizava: "Dado é dado, emprestado é emprestado". Embora que no momento do pagamento da dívida, recebesse, agradecesse o cumprimento do compromisso assumido, mas logo em seguida, devolvesse a importância, doando-a com um sorriso largo. Foram muitos os ensinamentos que eu e meus irmãos recebemos dele. Temos muito do que nos orgulhar de sua conduta, dos seus valores. Porém, um dos atributos que mais nos chamava a atenção era a sua inteligência e versatilidade. Era um autodidata. Nunca frequentou uma escola. Alfabetizou-se "sozinho", uma vez que casado com uma professora, convivia com livros e materiais didáticos que lhe impulsionaram ao que chamamos, hoje, de letramento. Gostava muito de cantar "loas"e de contar "causos". Admirava a poesia popular, portando sempre seu "companheiro" de escuta: um radinho de pilhas, hábito que herdamos também, dele. Assim, não descuidava de ligar o rádio para ouvir os programas de repentistas, os noticiários políticos e outros tantos que lhe interessavam. Com o advento da televisão, conjugava, ao seu bel prazer, esses instrumentos de comunicação e discutia com versatilidade os assuntos dos quais ele gostava.Cultivava, também, o hábito de ler a bíblia, o que lhe ampliava ainda mais o processo de letramento. De uma memória privilegiada, narrava sobre "pelejas" entre poetas repentistas que ele admirava. Djalma, também de memória admirável, (puxou ao pai, como dizemos por aqui), me repassou esta "que papai dizia, recorrentemente, para nossa alegria," entre Pinto do Monteiro e Louro do Pajeú.

Contava papai que Lourival Batista(Louro do Pajeú) falando sobre plantas, usou o termo "carola" em vez de "corola". Pinto do Monteiro bateu forte:

" Um rapaz que teve escola
E ainda canta errado
Fala em flor e diz 'carola'
Muito tem se confessado
Parte de flor é 'corola'
Precisa tomar 'coidado'. "

O cochilo de linguagem de Pinto do Monteiro, ao falar "coidado" em vez de "cuidado", ensejou a Louro do Pajeú a oportunidade de dar o troco, vingando-se do colega. E fulminou:

"Pra não ter um só errado
Errei eu, erraste tu
Errou Pinto do Monteiro
E Louro do Pajeú
Nesta palavra 'coidado'
Tira o 'o' e bote o 'u'."

Estas e tantas outras faziam parte do seu repertório, o que nos fazia escutá-lo, admirando aquele homem que tinha tantas qualidades e que serviu de parâmetro para nós, seus filhos e netos, que cultuamos a sua memória e nos espelhamos nele sempre que preciso for.
Por tudo isto, pai amado, você mereceu o nosso carinho e dedicação, especialmente, de sua neta/filha Rossana e dos demais filhos, netos e bisnetos que pranteamos, hoje, a sua ausência.
Oh! querido paizinho! Quanta admiração! Quanta gratidão! Quanta saudade! Não dá para expressar tudo neste texto... As lágrimas não me deixam continuar...

2 comentários:

ALFRAPOEMAS disse...

É preciso ser poeta para saber dar o valor devido às relíquias do nosso cancioneiro popular. Decerto, as lembranças tendem a arrastar consigo as saudades daqueles que amamos e que passamos a respeitar e admirar, ainda na tenra idade.
Seu texto, professora, me transpôs à minha infância, ainda quase que no colo do meu avô, quando pacientemente ele ouvia o despontar dos meus primeiros versos, e como querendo aprimorar o meu precário conhecimento, declamava cuidadosamente os versos da sua lavra, bem como algumas maravilhas desses saudosos menestréis.
Não invejo as suas lágrimas, pôs também as tenho agora nos olhos. Mas, fazer o que se elas foram talhadas para esses sublimes momentos?
Muito obrigado por fazer-me chorar!
Sempre lhe respeitando tanto,
Alfrânio (seu discípulo).

ALFRAPOEMAS disse...

A saudade mora em frente
A casa da solidão
E planta no mesmo chão
A sua amarga semente.
Frutifica, de repente,
Tristeza e melancolia.
Estes frutos, dia a dia
Vêm incluso em nossa feira
A SAUDADE É COMPANHEIRA
DE QUEM NÃO TEM COMPANHIA.

Um abraço, professora, e muito obrigado pelo mote.
Alfrânio.