domingo, 14 de setembro de 2008

Sejamos como o vinho...

Vivenciei, hoje, dois momentos. Primeiro, tive a oportunidade de assistir ao programa "Clube da Mulher", que homenageava uma compositora anônima, cuja peculiaridade era ser uma mulher de setenta e nove anos. Nesse programa, a compositora conseguira realizar um sonho acalentado há muitos e muitos anos. Ou seja, ter as suas composições interpretadas por cantores profissionais. O programa lhe proporcionou a realização desse sonho, conseguindo que ela participasse do musical "Eu sou o samba", com cenário de Carlinhos de Jesus. Almerinda foi preparada, participou de ensaios com um grupo musical, comandado pelos vocalistas Ivo Meireles e Bruno Ribas e teve a alegria de cantar com esses profissionais um samba de sua autoria, cujo refrão era "Ela é um desperdício de mulher". Auditório cheio, Almerinda toda produzida estava realizada e feliz. Os depoimentos de filhos e netos atestavam o orgulho por aquela mulher, cuja idade não foi impecilho para a realização dos seus sonhos.

Coincidentemente, o segundo momento também foi interessante. A leitura de um texto da escritora Lya Luft, intitulado "Setenta anos! E por que não?"
Segundo a autora, que afirma não ser chegada a badalações, pensou ainda em festejar os seus setenta anos bem vividos, mas depois se perguntava: por que festejar setenta, se já não é um fato tão difícil de acontecer? É melhor esperar os oitenta ou os noventa. Para ela, dizer que a certa idade vai-se "descendo a ladeira" é discurso de derrotistas que não combina com a sociedade atual e com a ascensão social da mulher. Acabou-se o tempo em que mulheres aos cinqüenta ou sessenta anos usavam vestidos longos (não porque estavam na moda), mas para se resguardarem, tendo em vista as suas idades.

Os dois fatos me levaram a algunhas reflexões, que compartilho com meus poucos e queridos leitores: A mulher, atualmente, mais madura e mais consciente de sua pujança, enquanto ser social, está muito à frente de determinados preconceitos e posicionamentos intolerantes daqueles que estão longe dessa realidade. A nosso ver, não é necessário camuflar a idade com práticas estéticas para que você possa "brilhar" ao passar dos anos. São outros atributos que devem permear o seu viver, o seu "estar no mundo". Os verdadeiros valores estão no seu modo de ser e conviver com as pessoas, ao respeito ao seu semelhante, à sua postura diante dos outros, na humildade dos seus gestos, ao envelhecer sorrindo, pois toda idade é bela quando se sabe vivenciá-la de acordo com seus limites e contextos específicos. O mais importante é sabermos que a alma não envelhece, não acumula rugas, nem definha com o tempo.

Portanto, façamos como Cecília Meireles que afirma em um de seus poemas:
"Eu aprendi com as primaveras a me deixar cortar e voltar sempre inteira."

Mesmo que o tempo, inexoravelmente, nos ceife das faces a beleza da juventude , saibamos que é do nosso interior que brotam os sonhos juvenis que nos alimentam e que contagiam os que vivem conosco e ao nosso redor. Sejamos como o vinho que ao envelhecer fica mais gostoso, mais palatável, mais saboroso, e não, como o vinagre, que quanto mais velho, mais azedo...